DEPRESSÃO COM “D” MAIÚSCULO
A Depressão é de natureza distinta da tristeza ou do desânimo que sentimos em alguns momentos da vida. Por isso, o “D” maiúsculo, a lembrar que se trata de uma doença. Uma pesquisa, realizada na cidade de São Paulo, sorteou e avaliou cuidadosamente 1464 pessoas. Demonstrou-se que 17% já haviam tido Depressão (dito de outra forma, uma em cada seis). A Depressão acomete cada vez mais pessoas, mesmo as mais dinâmicas e as que sempre foram alegres e otimistas, com histórias e condições de vida as mais diversas. A hereditariedade tem um peso determinante, e vários membros de uma família podem ser acometidos.
FORÇA DE VONTADE NÃO CURA DEPRESSÃO
Quem nunca teve depressão, geralmente a imagina como uma tristeza que pode melhorar a partir do esforço pessoal. Com o intuito de ajudar, pode dizer algo do tipo:
“Você tem que se animar! Faça caminhadas, vá pra academia! Pensamento positivo! Foi assim que eu consegui me levantar quando estive pra baixo…”
Essa “convocação para a melhora” só complica as coisas. É um erro, não funciona na Depressão.
ÀS VEZES A GENTE QUER AJUDAR E NÃO SABE O QUE FAZER… COMO LIDAR COM QUEM ESTÁ SOFRENDO DE DEPRESSÃO?
A doença, e isso faz parte do quadro clínico, mina a vontade e a iniciativa de pessoas que, antes, eram batalhadoras e cheias de vida!
A vivência de quem tem Depressão é bem diferente da que ocorre na tristeza. A pessoa sabe o que deveria fazer, mas simplesmente não consegue iniciar uma ação, persistir. Sente desânimo e impotência paralisantes, passa a acreditar que não conseguirá sair do fundo do poço. Cobranças por ânimo fazem-na sentir-se pior: mais incapaz, mais culpada, um peso para os outros…
ENTÃO NÃO TEM QUE INSISTIR…?!
“…Por exemplo doutor, tem dia que ele não quer sair da cama nem pra tomar banho, comer alguma coisa, ver uma televisão… O que a gente faz, então? Deixa ele quieto, larga lá?”
É mesmo angustiante para quem cuida. É mais fácil quando o doente quer melhorar (demonstra isso) e batalha para tanto. Ao lidar com uma pessoa deprimida, desesperançada e sem reação, nos sentimos ora frustrados, ora impotentes, ora enraivecidos… Não sabemos o que fazer. De fato, a Depressão tira a esperança, a força de vontade e a iniciativa. Não quer dizer que a pessoa “não aceita nossa ajuda”; ela simplesmente não consegue reagir e acreditar que no futuro estará bem novamente. Isola-se em trevas; não vê luz no fim do túnel, como se diz.
O QUE NÃO FAZER?
Desistir de ajudar
Fazer cobranças por melhora
Infantilizar a pessoa, tratando-a como se ela fosse criança
O QUE FAZER?
Compreensão e Apoio. Tanto quanto possível, permanecer ao lado (“tempo de qualidade”, poderíamos dizer), fazendo o que for possível (coisas simples, como uma curta conversa ou um silêncio companheiro, um chá ou um suco, uma pequena leitura). Tudo isso para demonstrar compreensão e apoio.
Gotas de otimismo. Quem está deprimido deve ser incentivado sim, com delicadeza, a fazer pequenas coisas. Ao mesmo tempo, deve-se, também, respeitar sua necessidade de ficar mais quieto. Como o desânimo costuma ser pior de manhã, quem sabe não seria melhor tentar algo no final da tarde? Um banho, um lanche leve, um pequeno passeio… Quem está deprimido não consegue iniciar uma maratona, mas pode dar alguns passos, com ajuda e incentivo discretos. Em vez de cobranças e broncas, gotas de otimismo!
Mudar a lente. A Depressão tira as cores e a alegria da vida, afeta a auto-imagem, a auto-estima, o interesse, a esperança. São comuns as idéias de incapacidade, de culpa, de ruína financeira, de morte. O que fazer diante disso? Após ouvir com atenção e respeito, ajude a pessoa a ponderar, lembrando-lhe de que está tendo sentimentos e tirando conclusões sob domínio da depressão. Procure contrastar, com delicadeza, qualidades e realizações pessoais às idéias e sentimentos negativos atuais. Mas lembre-se: ajudar a ponderar não significa convencer por insistência ou por disputa racional! Ao tentar demover as distorções provocadas pela Depressão, faça observações breves. Procure mudar a lente do negativismo e da desesperança.
Monitorar o tratamento. Um antidepressivo leva duas semanas pra fazer efeito, uma consulta de retorno precisa ser agendada, uma dúvida sobre a medicação que poderia ser sanada com simples telefonema para o médico, é preciso de companhia para ir ao consultório da psicoterapeuta, lembrar de tomar os medicamentos… Esses são exemplos de “obstáculos intransponíveis” para quem, devido à Depressão, está desanimado, sem energia e sem iniciativa. Você ajuda ao cuidar de alguns aspectos práticos do tratamento.
Prevenção do suicídio. Às vezes a depressão dá a mão ao desespero. A idéia de que seria melhor morrer, inicialmente rejeitada, passa a ser vista como a única saída para um tormento insuportável e sem fim. Algumas frases podem sinalizar o risco de suicídio. O risco se eleva quando coexistem, além da depressão, outras condições, como ansiedade, dor, solidão, perda recente, abuso de álcool, tentativa de suicídio, suicídio de alguém próximo, elaboração de um plano para se matar, carta de despedida, providências desejadas após a morte.
“Dona Ana faz tudo para o marido: faz comida, troca fralda, faz companhia… Mas ele passa todo o tempo falando que quer se matar e que ela tem que ajudá-lo a se matar… Ela nunca reclamou das coisas que tem que fazer por ele. O que a deixa mal é ele não querer continuar, é ele querer desistir, apesar de tudo o que ela faz por ele…”
Diante de qualquer dúvida, avise o médico se intuir um risco de suicídio e converse com ele sobre como lidar com a situação. É melhor dividir suas preocupações e não carregar esse peso sozinho. De modo geral, é preciso redobrar a atenção e cuidados dedicados ao doente, não o deixar só e mantê-lo afastado dos meios de suicídio, como, por exemplo, venenos e armas de fogo.
Fonte: Blog do Dr. Neury J. Botega